os gritos / tudo essas goela / de onde vem
lá de onde eu vivo
que não é de onde eu venho
mas vir
é a cada instante
- até nascer: você nasce sempre –
de onde eu venho
me perguntam quando fora do sul
porque lôra
de onde eu venho
me perguntam quando no sul
porque sotaques
de outros chãos
que marcam pés
marcam boca
mas aqui,
de onde eu vivo,
ia dizendo
essa boca que não sabe de onde vem
essa boca que sabe de onde vem
essa boca que abocanha forte os caminhos
ou:
lambe
ou:
sopra
dessa boca descaminhada
também
escovo
os caninos
escovo os molares
os pré molares
incisos
parágrafos
artigos
as leis de onde vem as mãos que caneteiam elas
as bocas cheias de dentes que salivam desejando-as ou desdenhando-as
as gravatas de quem faz as leis
de onde vem
os pés que tanto tanto tanto tanto tanto tanto tanto tanto tanto tanto tanto tanto tanto tanto tanto tanto tanto tanto tanto tanto tanto tanto tanto tanto tanto tanto tanto tanto tanto tanto tanto tem que rudiar terra rachar tremer
pra
talvez
conseguir
talvez
fazer
talvez
uma
lei
que
talvez
garanta qualquer coisa como
talvez
um direito
talvez
uma dignidade
talvez
de onde vem a caneta que com um só traço apaga
todas
essas
pegadas
os gritos
tudo essas goela
de onde vem
me interessssssssssssssssssssssssssssa
que dela
e c o a
isso nos faz caminhar
comover é mover junto
de onde nossa boca vem
abocanha
e caminha
porque todas
todas as bocas
precisam
comer
de onde minha boca vem
nos últimos agoras que aqui me desejo mapear
num mapa que deslizo
um mapa talvez babado
feito quiabo
saliva
babosa
buceta
escorrego
lenta
lesma
cartografo
gerúndio do meu peito
encontro e perco minhas terras
tanta
tanta
água
eu amo a falta
de silêncio
do mar
em cada gota
de água salgada
toda
a
suculência
de
cada
caju
e cada manga
que existe existiu existirá
- pois que todo tempo
é comer-se –
assim que:
planto
semeio
soumeiodomar
colho
silenciosamente
a estrondorosa ressonância
incessante
de tudo
que com o mar respira
em sonhos
eu sei
respirar
embaixo d’água
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